O Programa de Reintrodução de Peixes-bois da Amazônia já devolveu 31 animais à natureza e mais de 60 estão em processo de reintrodução.
Desde sua criação, há mais de quatro décadas, o Laboratório de Mamíferos Aquáticos da Amazônia (LMA) do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa – MCTIC) recebe filhotes de peixes-boi resgatados oriundos da caça ilegal e captura acidental em redes de pesca. O sucesso das pesquisas, do processo de reabilitação e manejo dos peixes-bois gerou um plantel de animais aptos para retornarem a natureza, permitindo a criação em 2008 do Programa de Reintrodução de Peixes-bois da Amazônia, com apoio da Ampa. Além da reintrodução em si, o Programa colhe informações sobre a capacidade de adaptação dos peixes-bois criados em cativeiro ao ambiente natural, estudando seus movimentos diários e sazonais, área de vida e uso do habitat em pequena e larga escala.
O termo Reintrodução é definido como a “tentativa de restabelecer uma espécie em parte de sua distribuição geográfica original da qual foi extirpada, extinta ou está em declínio”. Programas de reintrodução são realizados como alternativa para aumentar o tamanho das populações e promover a preservação de espécies ameaçadas de extinção. Além de oferecer oportunidade para estudos ecológicos na natureza, as espécies reintroduzidas atuam como excelente elemento para a educação ambiental.
Atualmente, 62 peixes-bois estão no processo de reintrodução: 47 animais estão em reabilitação no Inpa, em Manaus, e 13 estão no semi cativeiro, no lago artificial em Manacapuru/AM.
Entre 2008 e 2009 ocorreram as primeiras tentativas de reintrodução no rio Cuieiras, afluente do rio Negro, com a soltura de quatro machos adultos. Estes animais mostraram dificuldades de readaptação a natureza, tornando necessária a revisão do protocolo de soltura e inserção da etapa prévia de semi-cativeiro.
Desde 2011, os peixes-bois aptos e selecionados no cativeiro do INPA são mantidos por um ano na área de semi cativeiro, em parceria com a propriedade particular Fazenda Seringal 25 de Dezembro, localizada no município de Manacapuru-AM, distante 70km de Manaus. O lago de semi cativeiro possui área de 13 hectares e profundidade entre 1-4 metros, além de quelônios e inúmeras espécies de peixes, como o pirarucu e tambaqui. Esta etapa, anterior à reintrodução definitiva na natureza, favorece a readaptação gradual dos peixes-bois cativos à natureza, permitindo aclimatar os indivíduos às condições naturais do ambiente, como temperatura e turbidez da água, variação sazonal do nível dos rios, alimento natural e minimizar o comportamento estereotipado de natação nos tanques do INPA. Neste momento, 13 peixes-bois vêm sendo mantidos e monitorados pela Ampa no semi cativeiro.
Desde 2016, a reintrodução dos peixes-bois tem sido realizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Piagaçu-Purus, localizada no baixo rio Purus e distante 223km de Manaus. Para aumentar o engajamento e apoio das comunidades locais, são realizadas atividades de educação ambiental com as comunidades locais da reserva. A seleção da área para a reintrodução definitiva dos peixes-bois é realizada a partir de alguns critérios, como registro da espécie na região, disponibilidade de alimento, ausência ou declínio da caça da espécie, estar inserida dentro de unidade de conservação e deter apoio das comunidades no processo de proteção e monitoramento dos animais.
O transporte dos animais do semi cativeiro até a Reserva Piagaçu-Purus é realizado com barco regional, com os animais mantidos em piscinas com água, durante 20 horas de viagem. Na chegada, os comunitários têm a oportunidade de visitar e dar as boas-vindas aos animais. Antes de liberados, cada peixe-boi recebe um cinto transmissor VHF de frequência única, adaptado ao pedúnculo caudal, com 800g de peso. O monitoramento dos animais é feito diariamente por comunitários e ex-caçadores de peixe-boi da Reserva, capacitados para utilizar os equipamentos de rádio telemetria.
Até o momento, a inclusão da etapa de semi cativeiro no protocolo apresentou 100% de sucesso na sobrevivência dos indivíduos pós-soltura. A seleção de habitats adequados para a espécie na estação seca e chuvosa, a sobrevivência dos indivíduos e a ausência de contato com humanos são fortes indicadores de sucesso. Adicionalmente, oito meses após a soltura, dois animais foram recapturados, mostrando aumento no comprimento e massa corpórea. Por se tratar de uma espécie endêmica da Amazônia, a consolidação do programa de reintrodução de peixes-bois representa um importante avanço na conservação da espécie e seu habitat. Por ser um projeto de longo prazo, as experiências e resultados acumulados até o momento são extremamente importantes para traçar as diretrizes de manejo e conservação dessa espécie endêmica da Amazônia. Ao longo de 2019 e 2020 planeja-se reintroduzir na natureza ao menos 20 peixes-bois da Amazônia.